Banco de Portugal diz que está disponível para com a Acapo, ou qualquer outra associação, fazer a análise da situação e resolver eventuais problemas.

“Para os bancos nacionais todos os cegos estão interditos", diz a Acapo Pedro Cunha

São cada vez mais as queixas de associados da Acapo — Associação dos Cegos e Amblíopes de Portugal “que se vêem impedidos de celebrar contratos de abertura de conta bancária e outros”. A denúncia foi feita nesta sexta-feira, pela direcção nacional da associação, num encontro com jornalistas, em Lisboa.

A associação diz mesmo que vai “recorrer aos meios judiciais que tem ao seu dispor para proteger os seus associados” contra o que considera ser uma prática discriminatória.

“Os bancos recusam que uma pessoa cega abra uma conta”, diz na Ana Sofia Antunes, presidente da direcção nacional da Acapo. Alegam que não conseguem garantir que essa pessoa tome conhecimento do conteúdo dos documentos que lhe são dados a assinar e que as pessoas cegas não sabem ler. “Mas as pessoas sabem ler e sabem escrever, só que não é com o código utilizado pelas pessoas que estão nos bancos”, prossegue.

A actuação dos bancos, pelo menos de alguns, estará relacionada, segundo Ana Sofia Antunes, com novas orientações, emitidas recentemente, do Banco de Portugal (BdP). Contactado pelo PÚBLICO o BdP faz saber através do gabinete de comunicação que "está inteiramente disponível para, em conjunto com a ACAPO e/ou com qualquer outra associação similar, analisar a situação relatada e, sendo o caso, adotar as medidas necessárias tendentes à sua eliminação".

Acrescenta contudo a seguinte nota: "No que se refere às normas regulamentares do Banco de Portugal sobre prevenção do branqueamento de capitais e financiamento do terrorismo (Aviso nº 5/2013, de 18 de Dezembro) e, em particular, aos requisitos ali previstos para abertura de contas bancárias, julgamos não preverem as mesmas quaisquer procedimentos que possam inibir ou dificultar o relacionamento das instituições de crédito com as pessoas portadoras de deficiência visual."

A Acapo conta outra realidade, onde as dificuldades estão bem presentes. “As pessoas cegas sabem ler e são os bancos que não disponibilizam formas de aceder aos conteúdos, nomeadamente em formato electrónico, nem tão pouco autorizam os seus funcionários a fazer uma leitura presencial” dos documentos, diz a dirigente da Acapo. “Os bancos exigem a presença de notário ou advogado para reconhecimento presencial de assinaturas e termo de autenticação dos documentos assinados pelas pessoas cegas, o que acarreta custos que os particulares têm de suportar.”

Nalguns casos, prossegue a Acapo, exige-se uma “assinatura a rogo” — ou seja, alguém assina pela pessoa com deficiência visual, perante notário. Isto, “mesmo quando as pessoas cegas sabem assinar”.

Na prática, diz a Acapo, aplica-se às pessoas cegas o regime de interdição previsto no Código Civil — que diz no seu artigo 138 que “podem ser interditos do exercício dos seus direitos todos aqueles que por anomalia psíquica, surdez-mudez ou cegueira se mostrem incapazes de governar suas pessoas e bens”. Em suma: “Para os bancos nacionais todos os cegos estão interditos.” Para a Acapo, isto viola o direito internacional e nacional, nomeadamente a Convenção sobre os direitos das Pessoas com Deficiência e a Constituição da República Portuguesa.

 

 

in Público

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